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08/11/2014

O  relógio marca pontualmente as 8h enquanto inicio esse texto. 8h do dia 8 de novembro, ou seja, de um sábado. Ainda não me acostumei com a ideia de estar acordado em momentos tão improváveis. Logo eu que sempre fui um apaixonado pelas manhãs dorminhocas que costumavam embalar os meados dos meus finais de semana.
Aprendi quando criança que conforme a idade passa, precisamos dormir menos. Não sei se é isso o que está acontecendo agora nos meus vinte e tantos anos. Acho que não. Sigo com a necessidade de dormir, mas preciso - digamos - de algo que antes não precisava: preciso dormir enquanto é noite. Por isso o sono chega mais cedo e por isso vai embora mais rápido, me permitindo presenciar cenas até então inimagináveis: ver meus pais levantando, por exemplo.
A disposição em estar em pé logo cedo marca uma segunda fase de mudanças em minha vida. É claro que mudamos todos os dias, mas existem fases que realmente percebem-se mudanças. A primeira ocorreu com a chegada da adolescência. Mais dramática que essa, com certeza, talvez pelo fato de nunca ter me ocorrido que a vida mudaria nossa ótica. A outra agora.
8h08 agora. Estar acordado não significa disposto a escrever. É um tema que vou voltar a falar. Só isso.

06/11/2014

De passagem...

Sei que está de passagem e que não tardará em partir. Sei que esse reencontro nos proporcionará mais uma despedida, e mais uma vez ficarei aqui vendo os dias passarem, me distanciando cada vez mais do tempo que estive contigo. Sei que vou sofrer e terei que lidar com as minhas feridas. Sei que me arrependerei e chorarei sua ausência. Sei que quererei ter escolhido não te encontrar, não ter te conhecido, não ter vivido. Você vai e ficam comigo todos os lugares que me fazem pensar em você. Você vai e deixa comigo a angústia de esperar a próxima vez. Haverá uma próxima vez? Só a mentirosa esperança me faz acreditar nisso. Sei que nosso tempo é finito e tão breve quanto o brilho de uma estrela cadente. Sei dessas coisas, mas eu sei o que eu quero. E eu só quero você.

04/11/2014

Quando acaba a esperança...

Afinal de quem é a culpa quando um jovem comete suicídio? De quem é a mão que puxa o gatilho? Quem foi de fato que lhe transpassou a faca?

Vivemos tempos de denúncias, de ódio escancarado. Quando tentamos encontrar a solução apontando os dedos uns aos outros com discursos raivosos e em altos decibéis. Mas e quando um jovem tira sua própria vida, ele é a vítima ou o homicida? A quem devemos denunciar e condenar?

A nós mesmos. A todos nós que permanecemos vivos e com sentido de vida. A todos nós que mantemos acesa alguma chama de esperança e esquecemos de partilha-la com  quem se foi.

Perdemos tempo demais encontrando defeitos nos outros enquanto somos nós os omissos que matam com tal omissão. Quantas vidas poderiam ser preservadas apenas se partilhássemos aquilo que enche nossos corações.

Passamos muito tempo olhando para os culpados e muito pouco tempo para quem precisa ser cuidado. Ninguém se suicida de uma hora para outra. Antes, certamente, houve o anúncio da tragédia através de um olhar suplicante, sedento por respostas, ansioso por sentido.

Negamos-lhes o sentido. Ocultamos a reflexão. Oferecemos respostas mundanas quando a necessidade lhe era o eterno. Oferecemos a solidão e a ilusão de se lutar por um novo Éden. Destruímos as almas e elas estão indo embora com o nosso consentimento.

Que Deus tenha piedade das almas que se suicidaram. Que Deus tenha piedade também de nós.

27/10/2014

Querida, estou de volta. De volta àqueles lugares, os mesmos lugares que já não são mais os mesmos. Vejo de novo o velho jornaleiro cujas manchetes já não importam mais. Volto para as ruas por onde passamos mas agora que passo não reconheço mais. Não há mais as flores que costumava ver ou talvez o aroma falso que fingir sentir. As crianças seguem brincando como em todo verão. É verão? Nem parece verão. O céu que vejo é cinza nessa velha rua que não reconheço mais. Cinza porque não o vejo, apenas imagino. Não olho mais para cima como costumava. Só vejo o chão sujo dessa rua qualquer. Tão diferente dos tantos corredores limpos que cruzei tantas vezes para te encontrar naquelas tardes de visita em que com aperto tínhamos de nos separar. Daquele hospital carrego o cheiro típico dos hospitais, e trago-o comigo para essa rua que não é mais nossa.
Meu amor, estou em nossa casa que já não é mais nossa. Nem minha. Desconheço essas paredes que se tornaram tão frias agora que não está. Desconheço esses cômodos tão grandes que pareciam tão pequenos quando inventava de replanejar os móveis. Desconheço o homem que vejo no espelho daquela suíte que costumava ser nossa. Já não estás aqui amor, e levaste contigo tudo o que existia porque do que sobrou, nada mais existe, nada mais tem cor, nada mais importa.
Voltei amor, mas fiquei. Fiquei contigo e morri contigo. Estou onde estás, enquanto perambulo pelos nossos lugares que já não são mais nossos e hoje encantam outros casais. Não sou mais eu amor, não estou de volta. Não sei quem sou...

07/10/2014

Pequenas bobagens diárias...

Dos pequenos prazeres da vida, é inquestionável o de se comer um Nutella gratuito. É, gratuito, de graça, sem custo, pago por alguém. É que já cresci com a ideia de que o Nutella é um produto caro. Hoje sou meio independente e com meu trabalho consigo comprar um ou outro pote por mês, mas ao tentar passa-lo no pão, sempre vem aquele ímpeto de dar uma "miguelada" para ver se dura mais, sabe, um peso na consciência. Já comi Nutella no pão, já fiz uma outra receita com ele, já me esbaldei comendo direto daqueles potes gigantes que a gente só acha quando está "lá fora". Mas quando consigo comer de graça, não há limites para a espessura do recheio, não há contagem de colheradas, não há culpa, só há paz com gordices e nesses instantes, nesses pequenos instantes de graça, me sinto no céu.

22/09/2014

O outro lado da decepção...

- Estou decepcionada com você.
Com estas palavras saiu, deixando com ele o silêncio insano que tudo acusa e a solidão sufocante de se estar com as próprias culpas. Não conseguira entender em qual curva de um caminho em que só amou conseguira decepcioná-la.
Decepção.
Antes estivesse brava. Antes o odiasse. A raiva e o ódio contém lá, ainda que paradoxalmente, suas doses de paixão. A decepção não. Para ela haverá o retorno, os dias terão passado quando ela perceber que já não sofre mais por ter sido decepcionada.
Ele, no entanto, carregará para sempre o pesado fardo de ter decepcionado quem amou. A decepção não mata o amor, talvez até o floresça. Mas mata quem o sente. Pelo amor, decepcionar alguém é insuportável. Como poderá superar as possibilidades que ele mesmo minou? Como superar a imagem de alguém que partiu. Como superar a culpa provocada por si mesmo, em plena razão?
Sofrer acontece, não depende de nós. Mas quando depende, quando se é a causa, como dói sofrer.

15/09/2014

Escuta amor...

Escuta amor. Desde que você chegou a solidão já não me assusta. Ficar sozinho não dá mais pavor e traz consigo apenas uma sensação de saudade. Do mundo também não tenho mais medo. Já não sou mais o menino que era antes, pois com você confirmei que nasci para ter a honrosa responsabilidade de ser marido e pai. Se já conheci você que é a pessoa mais importante da minha vida, não me espanta conhecer mais ninguém, independente de seu cargo, posição ou título.
A sombra já não cria mais os fantasmas que costumava criar. O frio já não é tão cortante desde que tenho você comigo. Sou homem feito, de fato. Feito e completo, pois habita em mim o amor. Há homem sem amor? Não. Há monstros, há o vazio. Vazio que desconheço desde que você chegou.
Mas sabe amor, ainda resta um medo. Um medo que não aprendi a lidar. Um medo sem solução que me faz apenas penar. Desde que te conheci, de todos os medos que perdi ganhei logo um que não tinha: tenho medo de morrer. Que pena amor, que pena é morrer. Não pelo que vem depois da morte, a esperada vida eterna, mas pelos dias que não mais passarei contigo, pela tua voz - tão doce - que não mais ouvirei, pelas infinitas horas que poderíamos passar em nosso pequeno universo particular e não passarei.
Morrer acontece, mas por que é tão breve? Escuta amor, a vida é curta, e sempre é curta quando se ama, não importa o quanto dure. Mas por que dura tão pouco? Tenho medo de morrer, amor. E medo de viver, viver sem você.

03/09/2014

E Sara 'a Settembre

Sabe que eu gosto desse tal de setembro. Nada de fabuloso me aconteceu nesse mês. Não tem dias santos e a família não costuma se reunir. 

Poderia dizer que é devido ao fim do inverno que ele anuncia, mas em um país tropical isso soaria de forma mais poética do que prática. O que é então que setembro tem de especial? Não sei.

Setembro é doce nas palavras, eufônico. Anuncia a primavera e as flores que quem não regar continuará sem ter à vista. Mas por setembro ser setembro, não carrega em si nenhuma homenagem a um passado glorioso ou mitológico. É o sétimo mês de um calendário antigo e só. 

Ele chega para nos anunciar que o ano pegou a reta final. Vem por aí uns frutos a colher, algumas festas a festejar, algumas pessoas para rever. Setembro nos lembra que daqui a pouquinho comeremos chocotone. Setembro nos mostra que a vida está passando, mas ao contrário de dezembro, ainda dá tempo, levemente, de se cumprir todas as metas.

Setembro, doce setembro, seja bem-vindo entre nós. 

07/08/2014

Sobre ela...

Tenho em minha mesa um porta-retratos exibindo nossa primeira foto. Não é por acaso. Ainda que estejamos no início da vida, caminhar junto à outra pessoa é ir desvendando aos poucos todas as qualidades e defeitos que ali estão. É encantar-se com as novidades, sorrir a cada bobeirazinha e até se assustar com alguma mania. Estar com alguém é desvendar um mundo. Uma viagem que não se volta, nunca. Pode-se parar no meio, querer pular, mas nunca voltar.

Neste caminho, corre-se o risco de não mais enxergar a largada, não mais entender o porquê. Por isso a foto sempre está ali, mostrando aquela por quem me apaixonei no dia em que me apaixonei. Por isso me lembro de que se hoje a amo tão incondicionalmente, é porque um dia eu desejei amar, eu escolhi amar. E amar apenas ela. Não é que eu tenha medo de deixar de amá-la, mas apenas uma precaução para que eu nunca deixe, nem por uma ocasião, de tratá-la bem. E para isso às vezes é preciso enxergar com o primeiro olhar, para que se possa reviver o doce caminho que aqui nos trouxe, para que eu nunca me esqueça de que um dia eu não a tive e que hoje, por tê-la, sou mais feliz.

15/07/2014

Conselhos meus com 30 anos a mim, com 20.

Algumas pequenas coisas que eu deveria saber quando tinha meus vinte e poucos anos...

Por algum motivo, quando tinha vinte anos, nunca pensei onde e como estaria aos 30. Hoje, quando comecei a avaliar aquela época, me dei conta da quantidade de erros que cometi e do tanto que aprendi nessa uma década de vida. Por isso tomei esse tempo para escrever (a mim mesmo) alguns conselhos. 

1) Viaje
Tens ainda muito pouca responsabilidade. Portanto saia e viaje. Quando chegar aos 30, quererá viajar de forma diferente, gastando um pouco mais, fazendo coisas um pouco mais caras, comer nos melhores restaurantes, hospedar-se em hotéis ao invés de albergues. Mas se trabalhares um tempo para juntar o dinheiro necessário para experimentar o mundo de forma barata e com mochila, isso não irá lhe matar aos 20 e poucos anos. Mas antes de partir, já que ainda não conhece nada, segue algumas observações:
- Não viaje a lugares óbvios;
- Viaje a lugares desconhecidos e raros;
- Viaje para aprender;
- Viaje para descobrir;
- Viaje para lugares que te instiguem a pensar o que (e quem) quer ser no futuro.

2) Construa
Não passe muito tempo trabalhando para realizar o sonho de outras pessoas para sua vida. Nem passe muito tempo em reuniões. Use seu tempo para pensar como é a sua própria visão de mundo e para onde quer levar sua vida.
As reuniões são os lugares onde as ideias morrem. Bem disse certa vez meu pai: “quando as duas partes estão interessadas, um negócio se fecha em cinco minutos”.
Se você se encontra trabalhando em uma empresa e quer se demitir porque não é feliz, demita-se. Vamos. Se ainda não está trabalhando, vá para o item cinco.

3) Leia
Leia todos os dias. Leia tudo o que possa ler. Não leia apenas as coisas que já sabe e gosta. Leia sobre pessoas. Leia sobre as pessoas.

4) Deixe de ver televisão
Imediatamente. Pare. Não está te ajudando a ser melhor.

5) Trabalhe
Mas não aceite um trabalho apenas por trabalhar. Sério, não faça isso (releia o item dois).

6) Confie
Mesmo que isso mate suas amizades. Mesmo que mate suas ideias. Mesmo que perca teus amigos. Mesmo que isso signifique que se machucará.
Confie nas pessoas até que te deem uma razão para não confiar mais. Mas sempre deves dar outra oportunidade.
E lembre-se: não sejas ingênuo. Há muita gente lá fora querendo te machucar.

7) Conheça pessoas
As pessoas são a melhor e a pior coisa que podem acontecer em sua vida. Alguns te ajudarão a chegar longe e rápido. Outras se dedicarão a te atrasar e lhe fazer perder. A maioria está no meio termo. Alguns são normais. Poucos são excelentes.
Algumas poucas pessoas mudarão sua vida para sempre. Encontre-as.
Não são necessários muitos amigos ou muitas pessoas ao teu redor. O que você precisa é de pessoas surpreendentes que fariam por você o que farias por elas.

8) Valorize o tempo
Não perca tempo com pessoas que não confia. Não perca tempo dedicando amor ou amizade a alguém que vai te enganar. Não perca tempo com amigos que não te tratam como você os trata (e releia o item sete).
Não se atrase.
Valorize o tempo das outras pessoas. Se você chegar tarde, significará que você não se importa com quem lhe espera. Existem pessoas que não se importam por você chegar tarde. Cuidado, elas estão mentindo.

9) Falhe
E falhe bastante. Falhe seguidamente. Falhe no amor. Falhe em socializar-se. Falhe em fazer amigos. Falhe no trabalho. Falhe nos negócios. Falhe com sua família e falhe com seus amigos.
Falhe. Mas falhe rápido e aprenda uma lição.
Se não aprender algo a cada vez que falhar, então realmente terás falhado. Do contrário, se aprenderes algo, então terás crescido. Cada vez que se cresce e aprende e falha, será melhor e saberá como obter êxito nas coisas.

10)   Tenha êxito
Não há nenhum ponto da vida no qual terá êxito. Não nos seus vinte e poucos anos. Não dá.
Agora, supere isso e comece a construir as coisas para o futuro (leia o item dois e combine-o com o item nove).

11)   Tenha paciência
Deves ser paciente. As coisas que valem a pena fazer não merece ser feitas rapidamente. Nada que valha a pena construir merece ser construído às pressas. Nada de valor é formado em minutos.
Planeje em décadas. Pense em anos. Trabalhe em meses. Viva em dias.

12)   Apaixone-se
Valorize a pessoa que escolheres (ou te escolher) cuidar. O amor nos faz felizes. Tome o tempo dela e use-o da melhor forma. Encontre alguém que te acompanhe na busca por serem pessoas melhores. Que te respeite. Que não te chantageie. Que te permita ser. Alguém que goste de viajar, de construir e de ler. Que trabalhe no que ama. Que tenha confiança e que sabe escolher as pessoas que a rodeiam. Encontre alguém que valorize o tempo dos outros, que cometa falhas, que busque êxito com paciência. Mas, sobretudo, que queira também se apaixonar.

30/06/2014

Crônica de uma boa noite

Guarulhos, sexta-feira. Passava da meia-noite e lá eu me encontrava em uma rua qualquer da periferia. Fazia frio e o clima convidava para uma boa noite de cobertas, pipoca e filme. Ainda assim havia uma pequena movimentação na frente daquela casa cujos donos nem conheço o nome. E nem precisou saber. Ao aproximar-me, fui bem recebido e nem precisei me explicar, fui convidado a entrar. Estava ali após um convite inusitado de um amigo: "Vamos rezar o terço?". "Ok!" Foi assim que saímos de Campinas para experimentar o inesperado.

Ao entrar na casa, lá nos fundos, em uma varanda, mal pude acreditar: mais de 60 jovens sentados, esperando a oração começar. Acomodei-me e pude observar a todos ali presentes. Homens, mulheres, negros, brancos, loiros, e toda a diversidade que se pode encontrar. Todos devidamente agasalhados, mas felizes. Encontrei muitos sorrisos naquela noite.

E iniciou-se o terço, com a participação de todos. Sem conversas paralelas, sem grandes espetáculos (dois violões acompanhavam as vozes na hora que se era para cantar). Entre um mistério e outro, uma singela e significativa apresentação teatral. Ciente da mística que envolve o terço cheguei a imaginar Maria por ali, feliz em ver tanta gente atendendo seu pedido, mas confesso que passou pela minha cabeça: "devem estar aqui pela festa que acontecerá depois".

Doce engano.

Ao término do terço, com os corações aquecidos todos se levantaram, cumprimentaram-se e me acolheram ainda mais. Aos poucos foram se despedindo e indo embora. Outros insistiam em ficar e na pauta das conversas, sempre uma partilha de experiências. Iam embora prometendo se encontrar na próxima sexta-feira, como tem acontecido nas últimas mais de 60 sextas-feiras desde que eles decidiram, em um momento de dor, iniciar o grupo. Fui embora também, sentindo-me em casa, em família, com novos amigos e novas experiências.

Estiveram lá para rezar, simplesmente porque rezar é importante. E naquele anônimo encontro percebi a grandeza de nossa fé. Estamos vivos e estamos por aí quando menos se espera, mais fortes do que se pode imaginar.

É bom ser católico, é bom ser família onde quer que eu vá.

Que Deus nos abençoe.

27/06/2014


"Há muito tempo, sim, não te escrevo.
Ficaram velhas todas as notícias."

Assim Drummond começa um poema, assim começo esse texto. Ao contrário dele, permaneço sem saber o que dizer. Há tanto o que se dizer! Mas quando? E por que?

Das escritas que faço, dos sentidos que busco, falta-me ainda descobrir o prazer de partilhar ao outro. Não cabe em mim, mas é meu. Sentimento egoísta de reter tudo em mim. Afinal quem poderia querer me conhecer? Quem conseguiria, de fato, me entender?

Gosto de quem sou. Cometo erros imperdoáveis, mas no geral, gosto de ser quem sou. Gosto de lidar comigo mesmo e a convivência interior, acredite, está impecável. Eu me conheço. Eu me entendo. E não preciso de grandes e chatas explicações para dizer o que quer que eu diga, para explicar o que quer que eu veja, para traduzir o que quer que eu sinta.

Sou um homem comum que às vezes se aflige por perceber que não há nada extraordinário ao seu redor. A vida segue imitando o vídeo, o mundo segue dando voltas (atmosféricas ou históricas). A imbecilidade que enxergo em tudo não me assusta: já ocorreu, está ocorrendo, infelizmente ainda mais ocorrerá. Os textos anteriores nesse blog, tão racionais e analíticos, foram escritos por alguém que se esforçou muito para tentar dar o menor grito de alerta. Tentar fazer o meu papel, ser sociedade, se importar com a sociedade. Bobagem. Todo mundo faz o que quer e o humano sempre gostará de trilhar os mesmos caminhos. Vejamos qualé que é. Amemos quando essa for nossa última riqueza, morramos honrando aquilo que realmente importa a um homem: a fidelidade à às coisas que teve fé.

É o que chamamos de princípios. É o que nos faz sermos nós mesmos. Sou feliz sendo eu mesmo. Sigo com os erros imperdoáveis, mas no geral, gosto de ser quem sou. Não me falta os outros e, quem me falta, já está aqui. 

Ciclos. No fundo tudo são ciclos. E quem pode parar essas engrenagens? Ao menos o humano, este, já provou que ele não é.


29/03/2014

A polêmica social como circo na República do Bananal

O assunto da moda nas redes sociais é a tal pesquisa divulgada pelo IPEA (Instituto de Pesquisas Economicas Aplicadas) onde sugerem que 65% da população brasileira acredita que as mulheres que se exibem merecem ser estupradas. Foi o estopim para mais uma chata e impensada enxurrada de postagens sobre "nojo", "vergonha", "medieval" e blábláblá. Cara, você não faz ideia do quanto é brochante ter que ver sua linha do tempo repleta de chavões e ódio, todos os dias. Chego a sentir saudades de quando a unanimidade (e a cegueira) da linha do tempo das redes sociais era sobre o Big Brother ou a final da novela. O povo parece que se politizou. Só que não.

Antes que me crucifiquem, como alguns já querem fazer: Eu não sou a favor de estupro (na República do Bananal é preciso dizer o óbvio às vezes, rs), repudio toda forma ilícita de ação e sou contrário à impunidade. Por ser católico, acho ainda mais repugnante, pois além do problema social, enxergo valores "invisíveis" em tal crime: ele rouba a dignidade do ser humano e afeta a sacralidade do corpo. Por ser católico tenho provavelmente mais motivos do que você pra ir contra esse crime que beira à aberração. O culpado pelo estupro ser o estuprador está para mim assim como o culpado pelo assalto ser o assaltante. É o óbvio, quase não debatível.

A minha crítica aqui é com relação à essa pesquisa que, aparentemente sem motivo (Afinal o IPEA é de pesquisas ECONOMICAS, e eu não entendi o por quê disso até agora) fomentar um ódio e uma reação tão truculenta na população que está cada vez mais dividida. É estranho como cerca de 4 mil pessoas de repente se transformaram na opinião nacional. Será esse o mesmo tipo de amostra que aponta que o Brasil gosta da Dilma? Não se sabe como essas pessoas foram abordadas, não se sabe como foi a resposta dos entrevistados (afinal entrevistados de pesquisa no Brasil devem assinar um termo de sigilosidade, "nunca na história desse país" se viu UM por aí dizendo que respondeu), só se sabe o resultado disso: reações acaloradas, ódio implantado, ideologistas de causas pobres e o mais interessante pro governo: o abafamento da crise sem precedentes na qual a situação está passando, com a tentativa de abertura da CPI da Petrobrás.

Vê como tem cheiro estranho no ar? Vê como é bom não ficar repetindo bovinamente tudo o que sugerem que você repita? Vê como o que realmente iria mudar esse país mais uma vez ficou fora do foco e passou despercebido? Vê como você, eu e mais de 65% da população brasileira está sendo enganada? Vê como eles ganharam? E ganharam de novo...

23/03/2014

Guerra de classes também é guerra de gente

Sabe aquela paz almejada, desejada e que era um desejo de senso comum até muito pouco tempo atrás? Parece que ela está sumindo aos poucos das linhas dos discursos políticos cada vez mais inflamados de parte da juventude brasileira. Se antes morrer pelo país era algo tão burro e "medieval" que não merecia sequer atenção e debate, a cultura de morte na qual vivemos hoje nos convenceu de que devemos matar e morrer por muito menos.

Sendo brasileiro há uns 25 anos apenas, nunca tive exemplos realmente suficientes do que é o patriotismo. Aprendi na escola que "o patriotismo são duas pessoas pobres morrendo pelo interesse das pessoas ricas". Uma doutrinação perigosa, já que estimula a paz (negando o patriotismo) estimulando o ódio (entre as classes sociais). Dito e feito. Hoje somos milhões de pessoas que odeiam as guerras promovidas pelo patriotismo estadunidenses mas prontas a destruir alguém (seja física ou moralmente) apenas por não seguir cegamente seu ponto de vista.

A verdade é que já há uma ditadura, a ditadura das opiniões. Questionar, levantar uma opinião que não seja a corrente, já é motivo para você ser ridicularizado, ofendido e maltratado por ditos "amigos" como se a relação humana e de afeto pre-existente não fossem o suficiente para sobreviver a uma simples divergência de opinião.

As ofensas estão por aí. A intolerância está por aí. O ódio crescente por "homens, brancos e heterossexuais" já se tornou uma bandeira. Não há discurso que me convença de que para corrigir uma injustiça histórica, é necessário criar outra injustiça. A briga vigente hoje não é por libertação, mas por imposição de algo mais forte, mais truculento, mais injusto. Esquecemos contra quem lutamos. Talvez nunca soubemos de verdade. Lutamos pela insatisfação, mas sem distinguir um inimigo. 

Levamos a guerra em um estado deplorável. Não nos preparamos para ela, não estudamos sobre ela, não entendemos contra quem é ela e por isso somos presas fáceis de um costume que nos pede para nos escondermos atrás das máscaras e da anonimidade pois, afinal de contas, para protestar contra um inimigo invisível, nada como um protestante anônimo.

Eles venceram. Não há modo mais fácil de se conquistar um país senão dividindo sua população. Não há mais pessoas, não há mais dignidade humana. Há posições, há um fanatismo violento que ultrapassou as brigas dos campos de futebol. Essa guerra já existe, está presente em cada ofensa gratuita que você faz a alguém "do outro lado". Está implícita na sua falta de discernimento em perceber que todos somos iguais. O racismo começa aí, a escravidão começa aí, o genocídio começa aí: na incapacidade de enxergar no outro, alguém exatamente igual a nós.

Que Deus nos proteja de nossas próprias misérias, e que nos faça entender que quando brigamos com classes diferentes estamos brigando com pessoas iguais.

21/03/2014

E o principal fica fora do resumo...

"Nunca antes na história deste país", ou pelo menos nunca desde que me conheço por gente ficou tão clara uma divisão ideológica da população. Talvez se vivesse hoje o Cazuza não teria problemas em achar alguma ideologia pra viver pois afinal de contas elas estão aí, basta escolher e pegar a tua.

Como um supermercado de informações e opiniões, o Facebook chegou sem perguntar ao certo se o ser-humano já estava preparado pra ser tão social, e a verdade é que ele trouxe uma das coisas que o brasileiro mais gosta de fazer: ter e dar opiniões, mesmo sem entender muito "qualé que é" o assunto.

E nessa briga ideológica, não faltam ofensas e reclamações para com todos aqueles que se pensa estar do outro lado da divisão ideológica. Nessa salada de críticas e protestos, sobressai na minha linha do tempo diversas postagens e críticas para com a "manipulação da mídia". 

As críticas ficaram evidentes depois do trágico e grave ocorrido com a senhora Claudia Silva Ferreira que foi arrastada por um carro enquanto participava (ou pelo menos estava presente) em um protesto no Rio de Janeiro. O caso foi divulgado em toda a mídia "para aqueles que queriam ver", ou seja, nada de manchetes sensacionalistas e repetições massantes, daquelas que fazem até o monge mais isolado ficar sabendo que está rolando. O problema nesse caso é que a barbárie tem como protagonistas os "repugnantes, pobres, sub-humanos e chorumes" inimigos da nação: a Polícia Militar. Pronto! Fez-se o enredo para os militantes encherem a cabeça (e o saco) de todo mundo com o velho discurso de "parcialidade da mídia coxinha".

Não quero aqui de jeito nenhum defender a mídia de grande massa, ainda tenho um pouco de juízo antes de fazer isso mas... acusar alguém de parcialidade exige de quem acusa, no mínimo, ser imparcial. E será que quem acusa realmente é? Quem acusa com tanta veemência e raiva essa morte trágica, gasta a mesma energia com a morte dos PM's, quando estas ocorrem e também não são noticiadas pela mídia? Afinal o protesto é contra a morte de inocentes ou apenas mais um grito ideológico sem alma?

Afinal estamos chorando a morte de tantos brasileiros nessa guerra sem fim ou estamos usando-as apenas para alimentar "nosso lado" nos discursos calorosos de ativistas "facebookianos"? Não dá para entender até onde isso vai. Uns atacam a Veja, mas leem fielmente a Carta Capital. Outros fazem o contrário. "♪ E a gente aqui no meio, no meio da cegueira..."

Até quando meu Deus? Até quando?

19/03/2014

Fraternidade e Quaresma

Nunca fui contra a Campanha da Fraternidade, promovida pela CNBB em caráter ecumênico desde 1964. Pelo contrário, acredito que se faz necessário de tempos em tempos um levantamento das questões sociais mais agravantes que por algum motivo passam despercebidas do olhar cristão.

Esse ano porém, muito tem me preocupado em todas as homilias que ouço quanto à justificativa de tal campanha acontecer no tempo da quaresma. O discurso é unânime: “A quaresma não serve para rezar mais, para jejuar mais. Não adianta fazer isso só no tempo da quaresma enquanto se tem o ano inteiro para fazer”. Tá certo, eu entendo a boa intenção envolvida nessa explicação. Mas quais são os perigos que envolvem descaracterizar a quaresma enquanto tempo de reforço nas orações? Afinal, o que é a quaresma?

A Tradição nos ensina que a quaresma é o período de quarenta dias dedicados à preparação da Páscoa. O catecismo cita a quaresma no parágrafo 540, dizendo que “todos os anos, pelos quarenta dias da Grande Quaresma, a Igreja une-se ao mistério de Jesus no deserto”. Ainda no catecismo, é feita uma reflexão sobre o porquê da quaresma. No parágrafo 1438 é dito que “Esses tempos (incluindo a quaresma) são particularmente apropriados aos exercícios espirituais, às liturgias penitenciais, às peregrinações em sinal de penitência, às privações voluntárias como o jejum e a esmola, à partilha fraterna”.

Portanto é nítido que a Igreja não deixa lacunas quanto ao significado do tempo da quaresma. Acaso aprofundar-se mais na oração e no jejum nesses quarenta dias é hipocrisia? Acaso não relembramos também os quarenta dias que Cristo jejuou? Seria Ele hipócrita? Acredito que não.

Com tudo isso, São Josemaria Escrivá vem resumir dizendo que “A quaresma coloca-nos agora perante estas perguntas fundamentais: Avanço na minha fidelidade a Cristo? Avanço em desejos de santidade? Em generosidade apostólica na minha vida diária, no meu trabalho quotidiano entre os meus companheiros de profissão?”

A quaresma é portanto um momento de repensar, um marco anual no qual podemos avaliar nossa caminhada parcial, perceber onde erramos, descobrir qual próximo passo dar. É de suma importância entender o que a Igreja pede quando propõe a quaresma. É de suma importância viver o que a Igreja pede quando propõe a quaresma. A Campanha da Fraternidade poderia caber em outro momento no tempo litúrgico comum mas, ainda que queiram coloca-la junto da quaresma (talvez para observarmos os preceitos quanto à partilha fraterna), é necessário que não se perca e não se distorça o significado total do tempo em que vivemos. Se o grande questionamento levantado por alguns membros da Igreja hoje é sobre se rezar mais no tempo da quaresma é hipocrisia, respondo a eles com um grande questionamento meu: não seria hipocrisia levantar um tema social no tempo da quaresma e depois simplesmente nunca mais falar disso? Vai saber...

14/02/2014

Renúncias...

"Tenho 23 anos e ainda não entendo muitas coisas. E há muitas coisas que não se podem entender as 8h da manhã quando te acordam para dizer em poucas palavras: “Daniel, o papa renunciou.” Eu apressadamente contestei: “Renunciou?”. A resposta era mais que óbvia, “Renunciou, Daniel, o papa renunciou!”.


O papa renunciou. Assim amanheceu escrito em todos os jornais, assim amanheceu o dia para a maioria, assim rapidamente alguns tantos perderam a fé e outros muitos a reforçaram. Poucas pessoas entendem o que é renunciar.

Eu sou católico. Um de muitos. Desses que durante sua infância foi levado à missa, cresceu e criou apatia. Em algum ponto ao longo da estrada deixei pra lá toda a minha crença e a minha fé na Igreja, mas a Igreja não depende de mim para seguir, nem de ninguém (nem do Papa). Em algum ponto da minha vida, voltei a cuidar da minha parte espiritual e assim, de repente e simplesmente, prossegui um caminho no qual hoje eu digo: Sou católico. Um de muitos sim, mas católico por fim. Mas assim sendo um doutor em teologia, ou um analfabeto em escrituras (desses que há milhões), o que todo mundo sabe é que o Papa é o Papa. Odiado, amado, objeto de provocações e orações, o Papa é o Papa, e o Papa morre sendo Papa. Por isso hoje quando acordei com a notícia, eu, junto a milhões de seres humanos, nos perguntamos “por que?”. Por que renuncia senhor Ratzinger? Sentiu medo? Sentiu a idade? Perdeu a fé? A ganhou? E hoje, 12 horas depois, creio que encontrei a resposta: O senhor Ratzinger renunciou toda a sua vida.

Simples assim.

O papa renunciou a uma vida normal. Renunciou ter uma esposa. Renunciou ter filhos. Renunciou ganhar um salário. Renunciou a mediocridade. Renunciou as horas de sono pelas horas de estudo. Renunciou ser só mais um padre, mas também renunciou ser um padre especial. Renunciou preencher a sua cabeça de Mozart, para preenchê-la de teologia. Renunciou a chorar nos braços de seus pais. Renunciou a, tendo 85 anos, estar aposentado, desfrutando de seus netos na comodidade de sua casa e no calor de uma lareira. Renunciou desfrutar de seu país. Renunciou seus dias de folga. Renunciou sua vaidade. Renunciou a defender-se contra os que o atacavam. Sim, isso me deixa claro que o Papa foi, em toda sua vida, muito apegado à renuncia.

E hoje, voltou a demonstrar. Um papa que renuncia a seu pontificado quando sabe que a Igreja não está em suas mãos, mas nas mãos de alguém maior, parece ser um Papa sábio. Nada é maior que a Igreja. Nem o Papa, nem seus sacerdotes, nem os laicos, nem os casos de pedofilia, nem os casos de misericórdia. Nada é maior que ela. Mas ser Papa nesse tempo do mundo, é um ato de heroísmo (desses heroísmos que acontecem diariamente em nosso país e ninguém nota). Recordo sem dúvida, as histórias do primeiro Papa. Um tal... Pedro. Como morreu? Sim, em uma cruz, crucificado igual ao teu mestre, mas de cabeça para baixo. Hoje em dia, Ratzinger se despede de modo igual. Crucificado pelos meios de comunicação, crucificado pela opinião pública e crucificado pelos seus irmãos católicos. Crucificado pela sombra de alguém mais carismático. Crucificado na humildade que tanto dói entender. É um mártir contemporâneo, desses que se pode inventar histórias, a esses que se pode caluniar e acusar a vontade, que não respondem. E quando responde, a única coisa que faz é pedir perdão. “Peço perdão pelos meus defeitos”. Nem mais, nem menos. Quanta nobreza, que classe de ser humano. Eu poderia ser mórmon, ateu, homossexual e abortista, mas ver uma pessoa da qual se dizem tantas coisas, que recebe tantas críticas e ainda responde assim... esse tipo de pessoa, já não se vê tanto no mundo.

Vivo em um mundo onde é engraçado zombar o Papa, mas que é um pecado mortal zombar um homossexual (e ser taxado como um intolerante, fascista, direitista e nazista). Vivo em um mundo onde a hipocrisia alimenta as almas de todos nós. Onde podemos julgar um senhor de 85 anos que quer o melhor para a Instituição que representa, mas lhe indagamos com um “Com que direito renuncia?”. Claro, porque no mundo NINGUÉM renuncia a nada. Ninguém se sente cansado ao ir pra escola. Ninguém se sente cansado ao ir trabalhar. Vivo um mundo onde todos os senhores de 85 anos estão ativos e trabalhando (sem ganhar dinheiro) e ajudam às massas. Sim, claro.

Mas agora sei, senhor Ratzinger, que vivo em um mundo que vai sentir falta do senhor. Em um mundo que não leu seus livros, nem suas encíclicas, mas que em 50 anos se lembrará como, com um simples gesto de humildade, um homem foi Papa, e quando viu que havia algo melhor no horizonte, decidiu partir por amor à sua Igreja. Vá morrer tranquilo senhor Ratzinger. Sem homenagens pomposas, sem um corpo exibido em São Pedro, sem milhares aclamando aguardando que a luz de seu quarto seja apagada. Vá morrer, como viveu mesmo sendo Papa: humildemente.

Bento XVI, muito obrigado por renunciar."

(publicado originalmente no facebook no dia 14 de fevereiro de 2013)

22/01/2014

Bom dia

A noite se consumiu em sua própria escuridão. Ficou pra trás tudo o que é digno de ser chamado passado. Veio o sol e com ele um novo recomeço, mais uma chance de ser feliz. O amanhã ainda não existe, e quem sabe se vai existir? "É hoje o dia da alegria", cantou alguém. A alegria exige o imediato. Que seja assim.
 
Copyright 2014 Cristiano Borges